domingo, 4 de abril de 2010

FOTOS ENVIADAS PELO MANUEL LOPES

Do Manuel Lopes recebi uma série de fotos, algumas chapei na última crónica, e as restantes vão aqui.

Na foto da direita está o Manel com a Milagres, uma lavadeira porreira que lavava o quico à malta e que tinha uma conversa e um palavreado rebuscado que não seria de esperar na pessoa nem no local.

Sim senhor: a Milagres!


Na foto à esquerda, vemos o Manel de frente para o Faustino, com o Branco de frente para a máquina (a presença "em palco" vinha-lhe do TEC, Teatro Experimental de Cascais onde se iniciou, certo?).


As seguintes mostram o "artista" em diversas poses.

Na última, em grupo, a preparar uma alta patuscada, parece-me distinguir o Sampaio do meu pelotão, de Sapadores (o 2º a contar da nossa esquerda).

Será?

sábado, 3 de abril de 2010

MANUEL LOPES - MAIS UMA CRÓNICA

Enviada pelo Manuel Lopes, aqui vos deixo mais uma crónica da sua comissão em Angola, como enfermeiro, na CCS do BART 6222/73.

"A OPERAÇÃO QUE NOS IA CUSTANDO A VIDA

Foi no mês de Fevereiro de 1974, o dia da semana não me lembro, para nós eram todos iguais, sei que talvez fossem quatro horas da tarde quando tocou a formar, a onde o meu comandante deu ordens que o pelotão de atiradores tinham que partir para a mata urgentemente para uma operação.


Como era a minha vez de alinhar, preparei-me logo, a bolsa às costas, pistola e G 3, lá partimos nós com a escolta, uma viatura á frente e outra atrás, sem sabermos o destino, só o alferes Sousa e o furriel Baía é que sabiam.

Apanhamos a picada com direcção ao Banza Quibaxe, seguimos em direcção á Sanzala Quipaulo que ficava a uma distancia talvez de uns 40 quilómetros, a noite já se aproximava, a certa altura começámos a ver fumo ao longe ao lado da picada por onde tínhamos que passar, como nos íamos aproximando, chegando perto do tal fumo, de imediato deixamos de o ver foi apagado à pressa, quando chegamos encontramos o sítio da fogueira, panelas e tachos velhos, vimos logo que tudo aquilo era para nos enganarem e despistar, também encontramos caixas de medicamentos vazias e escritas como deviam de ser tomados, reconheci logo a minha letra, foram medicamentos que eu tinha entregado a um velhote negro no dia anterior na enfermaria quando me encontrava de enfermeiro de dia.

Lá seguimos a nossa viagem sem medo, até que chegamos à grande Sanzala de Quipaulo já a noite ia alta, fomos recebidos em grande festa com batuque e palmas, mas nós não ligamos ao que via-mos era tudo fantochada para nos enganarem, estávamos sobre aviso, que era jogada dos turras para nos entreterem para nos fazerem a folha.

O alferes e o furriel foram logo chamar os dois guias que nós levámos, deram-lhe dinheiro para irem comprar um porco ao Soba para nós patuscarmos. O porco foi comprado pago e comido, o pior estava para acontecer, estávamos todos deitados no chão a descansarmos e à espera da hora da saída para a mata para a operação quando começamos a ver negros a correr por todo o lado armados, fomos saber o que se passava, finalidade, o soba tinha roubado o porco a uma velha, o problema resolveu-se com umas bebedeiras de cervejas CUCA.

Eram quatro horas da matina quando recebemos o código para partirmos, com arma e munições, cantil cheio de água e uma ração de combate, todos em fila indiana com a arma em punho e pronta a disparar, pelos trilhos do capim, caio aqui levanto-me a li e sem dar um pio, passados poucos quilómetros, o Paulo Sabú torceu um pé, dei-lhe os primeiros socorros, queria que eu o levasse às costas, eu respondi-lhe que esperasse sentado até eu preparar as costas, avançou e foi se quis se não ficava lá, às 8 horas estávamos no rio Luve, fomos obrigados a caminhar pelo rio muitas vezes com água pelo pescoço, assim fizemos muitos quilómetros até chegarmos ao rio Dange.

Subimos e descemos serras e montes, passamos rios e vales, matas fechadas que parecia noite, muitos e muitos quilómetros de capim fechado, fomos confrontados com muita bicharada, o calor era imenso, água para beber não havia, resolvíamos o problema da sede bebendo água choca, chamávamos mijo de pacássa, comida nem pensar, os guias sem notarmos desapareceram, quando reparámos andávamos perdido no meio das matas sem sabermos por onde, nós já pensávamos que não saíamos dali com vida.

A certa altura começamos a cair uns para cada lado, com fome, sede e esgotados, não havia esperança nos nossos pensamentos, eu andei a deambular para todo o lado sozinho à espera da morte até que encontrei o meu colega transmissões o Banana, que tinha perdido peças do rádio, não conseguia-mos pedir socorro, conseguimos ver ao longe uma palmeira, servio-nos de ponto de referência para descansarmos á sombra dela, para depois passarmos a noite se chegássemos com vida. A muito custo fomos os primeiros a chega ao destino, mas aos poucos chegaram todos á sombra daquela palmeira, todos com o mesmo objectivo.

Aí nos organizámos novamente depois de repousarmos algum tempo, em cima da palmeira encontrava-se um garrafão com sumo de palmeira a que os angolanos dão o nome de marufo, esse líquido foi distribuído por todos, ajudou para recuperarmos algumas forças.

Saímos dali sem saber para onde ir, só se via capim por todo o lado, o alferes Sousa desesperado, levantou a G3 virou-a para o ar e descarregou o carregador por não saber o que fazer, passado algum tempo apareceram os dois guias, deram muitas desculpas, mas não valiam de nada porque o alferes e o furriel já se preparavam para lhe fazer a folha, desfazê-los todos à rajada nós não deixa-mos porque queria-mos sair da mata antes da noite, sem eles não conseguia-mos, descobriram que tinham estado no destacamento dos turras a pedirem para nos deixarem passar sem nos fazerem mal.

O alferes avisou-os para não voltarem a fazer o mesmo erro porque já não servia de desculpas para nós, saímos dali chegamos ao local da partida já noite serrada á muito, mais mortos que vivos, fome, sede, com os pés em carne viva cheios de sangue, as viaturas já se encontravam á nossa espera na Sanzala do Quipaulo, chegamos ao quartel a Quibaxe já de madrugada."